Ao contrário do sentimento de otimismo observado em outubro – que sinalizava melhora no cenário político nacional –, a crise institucional entre poderes, agravada pelos recentes resultados ruins da economia e emprego, foram suficientes para a volta do pessimismo. Segundo o Índice de Expectativas dos Especialistas em Economia (IEE) – que ouviu mais de 130 especialistas em economia, no Ceará, de diferentes setores – o otimismo caiu 5%, ao variar de 102,8 para 97,6 pontos, graças à piora de seis dos nove indicadores analisados, segundo o levantamento divulgado, ontem, pela Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado do Ceará (Fecomércio-CE), juntamente com Conselho Regional de Economia (Corecon).
Contrariamente ao comportamento de alta observado no bimestre anterior (setembro e outubro) – voltando ao campo do otimismo, com 102,8 pontos – no período de referência (meses de novembro e dezembro), a volta do pessimismo contou com a queda observada em cenário internacional (que saiu de 135,3 para 105,1); taxa de câmbio (de 112,3 para 76,2); evolução do Produto Interno Bruto (PIB), que passou de 110,3 para 99,1 pontos; nível de emprego (89,2 para 72,4); oferta de crédito (84,3 para 82,7), e salários reais (43,1 para 40,7). “A queda da evolução do PIB caiu, porque, recentemente, tivemos a divulgação do PIB do 3º trimestre de 2016 com nova queda (-0,8%) e as estimativas de que teríamos um PIB já melhor no 4º trimestre, e uma variação positiva no primeiro semestre do ano que vem, deterioraram-se”, destacou o conselheiro do Corecon, economista Ricardo Eleutério Rocha.
Comportamento
O 16º levantamento da série bimestral mostra que os analistas revelaram otimismo apenas em outras três variáveis, como taxa de inflação (de 129,4 para 136,9 pontos), taxa de juros (de 135,5, ante 114,7 anteriores) e gastos públicos (129,9 contra 106,4). Embora ainda no campo otimista (acima dos 100 pontos), o cenário internacional recuou dos 135,3 para 105,1 pontos.
Conforme a metodologia, cada uma das variáveis analisadas gera três índices: de percepção presente, futura e de expectativa geral. Considerando a soma das variáveis, o índice geral recuou da 15ª para a 16ª pesquisa, ao passar de 102,8 para 91,1 pontos. A pesquisa mostra, ainda, que o otimismo dos analistas sobre o comportamento futuro das variáveis também caiu, ao passar de 124,6 para 116,7 pontos (-6,8%), ou seja, variação negativa que anulou a alta anterior, de 6,8%. Ademais, cabe destacar que a percepção otimista sobre o desempenho presente das variáveis registrou queda de 2,4%, alcançando 79 pontos contra 80,9 pontos da pesquisa anterior.
Segundo o estudo, as expectativas movem os agentes econômicos impactando, positivamente ou negativamente, o comportamento das diversas variáveis econômicas como consumo, investimento, poupança, taxa de juros, dentre outras. Ao mesmo tempo, o desempenho, positivo ou negativo das variáveis, índices e indicadores econômicos interfere na percepção dos diversos agentes econômicos. Assim, “as expectativas são, a um só tempo, causa e consequência do comportamento econômico”, informa a pesquisa.
Análise
Ao comentar os resultados do levantamento, o conselheiro do Corecon, Ricardo Rocha, destacou que, com mais uma recessão, em torno de 3,5% este ano, além dos 3,8% de 2015, as pesquisas vêm demonstrando que as expectativas, que estavam positivas para o PIB em 2017, começaram a se reduzir – como a Focus, por exemplo –, e pode até ter um terceiro ano de recessão, o que seria uma previsão mais pessimista. “Isso porque, com a crise institucional estabelecida recentemente, o cenário político se deteriora. A mais recente fase da operação Lava Jato, atingindo o partido do presidente e seus ministros – ferindo a própria figura do presidente –, enfim, essa deterioração política muito acelerada coloca incertezas muito grandes para o ano que vem e, com isso, os investimentos não aumentam, nem o consumo”, justifica o economista.
Com relação às outras variáveis, a evolução da oferta de crédito, com o endividamento e inadimplência elevados, “os bancos ficam mais cautelosos quanto à expansão do crédito, por isso, o pessimismo”, ponderou Rocha, acrescentando, ainda, que o desemprego bateu em 12% “e continua crescendo”. Com isso, “os salários reais, apesar de uma inflação menor para este ano e para 2017, continua se deteriorando”, frisou o especialista.
Quanto ao câmbio, depois da vitória do futuro presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, o dólar passou a subir no mundo e nas economias emergentes – como no Brasil –, em novembro e dezembro. “No cenário internacional (ainda otimista), as incertezas se manifestaram após as eleições, com a queda das bolsas e alta do dólar, e a possibilidade de aumento do protecionismo e um nacionalismo mais exacerbado, com isolacionismo e desglobalização – tanto que, em alguns países da Europa, que vão fazer eleições em 2017, há chances dessas correntes aumentarem”, ressaltou Ricardo Rocha.
Teto de gastos em vigor inibe crescimento
Na visão do economista Ricardo Rocha, o teto de gastos proposto pelo atual Governo, e já em vigor, por um horizonte de 20 anos, no Brasil, é uma eternidade. “Embora a economia necessite de um ajuste fiscal, a PEC dos gastos, no âmbito da política fiscal, é contracionista, restritiva e não anima a atividade econômica”, avalia. O economista aponta que a contenção de investimentos públicos, necessários nesse ambiente de alta dívida pública, no escopo da macroeconomia, “não produz crescimento a curto prazo, mas recessão, pois contribui mais para contrair a atividade do que para expandir”.
Por outro lado, ele entende que a medida mexe, positivamente, com as expectativas “porque anuncia que a dívida pode cair, mas no futuro – o que melhora a credibilidade e a confiança dos agentes econômicos, e pode levar a juros menores, melhorando a credibilidade”. Contudo, ele reforça que os efeitos de curto prazo são de redução de crescimento, “tanto que o governo, por um lado, faz esse ajuste fiscal – anunciando que vai começar –, e, por outro – ainda no contexto macroeconômico, para, de certa forma, compensar a política restritiva –, vem fazendo uma política monetária expansionista, reduzindo juros e a Selic, por duas vezes – embora os bancos não tenham absorvido o corte de juros do Banco Central, e nem passado às pessoas, através do cartão de crédito”.
Além de prever um desenho de curva de juros descendente, com a medida em vigor, ele acredita que o teto aprovado poderá sofrer alterações. “A gente acredita que, até lá (20 anos), há uma possibilidade de se rever esse prazo tão longo, pois os governos vão mudando e temos muita descontinuidade entre um governo e outro”, finalizou o economista.
Fonte: Jornal O Estado